8 de abril de 2014

A analítica existencial de Martin Heidegger e a descoberta da cura/cuidado como constitutivo essencial do dasein (ser humano)


Jossivaldo Araújo de Morais *


Dasein [pre-sença] é o modo pelo qual Heidegger denominará o ser humano, entendido como aquele ente que possui em si a capacidade de revelar o ser. O homem é o ente que tem em sua constituição a possibilidade de revelar ser, isto é, o ser humano é, como diz o autor, a “clareira do ser”: o lugar onde o ser se faz compreender, o lugar onde se diz o ser (HEIDEGGER, 1973).
Heidegger compreende o dasein como um ente em projeto, por fazer-se. Por isso esse ente é sempre a consequência de suas escolhas, nas palavras do filósofo “[...] sempre é suas possibilidades e isso de tal maneira que ele se compreende nessas possibilidades e a partir delas [...]” (2002:244). O fazer-se do dasein é sempre uma dupla possibilidade de ação [relacionamento], seja no tocante aos entes que estão à mão [a natureza e os demais entes], chamada de “ocupação”, quanto em relação às outras pre-senças, denominada “preocupação”.
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A compreensão de si a partir dessas possibilidades, segundo o autor, é algo que se perde por conta da decadência – estar mergulhado no ser junto ao mundo, isto é, mergulhado nas ocupações diárias inevitáveis, ocupado com as coisas –, que faz o “ser-aí” viver de modo inautêntico. No modo inautêntico da vida humana a relação com as coisas toma o lugar da relação entre as pessoas (do convívio social) e do convívio particular. O viver se torna um ocupar-se com o mundo.
Mergulhada no mundo a presença perde-se de si mesma e o verdadeiro sentido do seu ex-sistir; que são as suas possibilidades, manifestas a partir do conhecimento de si, de seu convívio com os outros e da ocupação com as coisas e com a natureza. Imersos no trato com as coisas o indivíduo não se permite ter contato consigo mesmo – ver a si mesmo em suas limitações e potencialidades, descobrir-se como ser finito -, e a vida parece ser algo controlável, fácil de lidar. Heidegger (2002) chama isso de “fuga de si mesmo”, pois se prefere estar envolto em atividades a estar a só consigo mesmo, a se deparar com a sua realidade mais verdadeira: a finitude, a limitação no tempo.
O autor relata que essa fuga é uma das possíveis respostas humanas ao submeter-se ao que ele chama de angústia, pois ela abre ao indivíduo o seu ser mais próprio: ex-sistir, projetar-se, construir-se, isto é, o dasein é fruto daquilo que escolhe fazer.

Na pre-sença, a angústia revela o ser para o poder-ser mais próprio, ou seja, o ser-livre para a liberdade de assumir e escolher a si mesmo. A angústia arrasta a pre-sença para o ser-livre para [...] (HEIDEGGER, 2002: 252).

A outra resposta possível é, de posse de sua realidade: a ex-sistência, a presença assumir que sua construção como ser-no-mundo e com os outros se dá num relacionamento expresso através daquilo que é seu modo mais próprio de com-vivência: a cura. Cura que na afirmação de Heidegger é também “cuidado” e “dedicação” e que permeia “todos os comportamentos e atitudes do homem” (HEIDEGGER, 2002). Assumir esse modo de existir constitutivo do ser humano é o modo autêntico de viver da presença.
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A cura, o cuidado e a dedicação, são, como modo constitutivo essencial do ex-sistir humano, a via de acesso original ao mundo, pois através dessa constituição fundamental da pre-sença, percebe-se o “outro” – pre-senças e entes do mundo – vai-se ao encontro, dispensa-se atenção, busca compreender (ocupa-se), dialoga-se, dedica-se, investe-se tempo, orienta-se, dá-se direção, troca-se experiências, enfim, pre-ocupa-se. É nessa relação, que vai além do aproximar-se, que o ser-aí – ser que se comunica com o ser, ou seja, que se percebe como ente no mundo e que é capaz de transcendê-lo, dando-lhe sentido e modificando –, constrói a si e ao outro.



* Professor Efetivo da Rede Pública Estadual do Tocantins (2010).  Graduado em Filosofia pela Universidade Estadual do Ceará – UECE (2005). Especialista em Docência do Ensino Superior pela Faculdade ITOP (2009). Especializando em Filosofia Contemporânea pela FACEL-PR (2014). Foi professor auxiliar na Universidade Federal do Tocantins nos cursos de Licenciatura em Filosofia e Licenciatura em Artes-Teatro (2012-2013). Foi professor efetivo da Rede Estadual do Pará (2007-2011).





REFERÊNCIAS

HEIDEGGER, Martin. Ser e tempo. 11. ed. Tradução de Márcia de Sá Cavalcante. Petrópolis: Vozes, 2002. p.243-262.

_____. Que é metafísica? Tradução de Ernildo Stein. São Paulo: Abril Cultural, 1973. p.223-261.


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